Hoje a morte veio me visitar, e
ela é a pior visita que pode aparecer na vida, a pior e a mais educadora
também. Engraçado que a brevidade dessa caminhada é a única certeza que temos,
mas vivemos como se não soubéssemos disso, vivemos achando que seremos eternos,
juntamos tesouros mais passageiros que o vento, construímos castelos de areia
todos os dias, e constantemente, ao dar atenção às coisas efêmeras esquecemos o
que importa de verdade.
Hoje a morte veio me visitar,
sentou a mesa comigo, arrancou dos meus braços mais um alguém que eu amo e me
ensinou silenciosamente inúmeras coisas sobre o valor e a brevidade da vida. Me
tirou o ar e o chão, tirou parte de mim, e abriu feridas de antigas perdas, me
fez sentar e abriu meus olhos para a vida que eu deixo escorrer pelos meus
dedos todos os dias.
Hoje a morte veio me visitar, e
me disse com um olhar que eu não sou imortal, que eu preciso aproveitar meus
pais, meu irmão, meus avós, meus tios, primos e amigos, pois eles também não
são. Ela me perguntou e me fez lembrar que coisas ficaram daqueles que
partiram, que tipo de recordação eu havia guardado deles, e eu não precisei
pensar muito para responder que eram os sorrisos, as músicas, os abraços, as
conversas que jogamos fora, o exemplo e a força, o amor, que sempre podiam ter
acontecido mais vezes, não fosse o desperdício do maior tesouro que temos: o
tempo.
Hoje a morte veio me visitar e
não disse nada, eu não disse nada, mas tanta coisa se esclareceu, e doeu, e
dói, e ainda vai doer pra sempre. Percebi que eu não quero perder tempo, e
queria gritar para o mundo, ensinar ao mundo o que aprendi nessas visitas, mas
o mundo não tem “tempo a perder” com essas coisas, todos estão apressados
demais para parar e conversar uns com os outros, nós infelizmente só escutamos
quando a própria morte vem nos ensinar com a dor, com o luto e a ausência. Vejo
tanta gente ocupada em semear o ódio, inventar diferenças entre as pessoas, se
importar com o pecado do outro, e apontar, segregar, ao invés de dar as mãos e
de abraçar. E, nessas horas, a morte ensina o quanto tudo isso é nada.
A morte foi, levou mais uma parte
de mim, e eu percebi que crescer é administrar perdas. Ficou a saudade, o vazio
que nada preenche, um gosto amargo na boca, mais um dia cinza no calendário,
mais uma ferida aberta no coração, e a lição de que não precisamos ter pressa, mas
não podemos perder tempo. Amemo-nos, a vida é curta demais e não podemos deixar
para aprender sobre o amor, ou sobre a vida com a visita da morte.
Débora Kelly